Quais as características mais marcantes nos santos que conhecemos? A vida dedicada à oração? O trabalho social e eclesial? A luta pelos direitos de seu povo? A dedicação aos que mais sofrem? Todos estes traços estão presentes na biografia do jesuíta Alberto Hurtado Cruchaga. Um dos nomes recentes do catolicismo na América Latina ainda é pouco conhecido no Brasil. Beatificado em 1994 e canonizado em 2005, Padre Hurtado é certamente o santo mais querido em seu país de origem, Chile.
Nasceu em 22 de janeiro de 1901, na cidade de Viña del Mar. Filho de Alberto Hurtado Larraín e Ana Cruchaga Tocornal, tinha um irmão mais novo, Miguel. Aos 4 anos de idade, Hurtado perde seu pai e sua família se muda para a capital, Santiago. Ali ele tem seu primeiro contato com a Companhia de Jesus, através do Colégio Santo Inácio.
Desde criança, dedica-se aos que mais necessitam. Mesmo sem ter condições, ele e sua mãe ajudavam no Patronato Santo Antônio. É este chamado ao serviço que o leva a cursar a faculdade de Direito, em 1918. Organiza um consultório jurídico, para atender sobretudo operários que não podem pagar pelos serviços.
Segundo as palavras do Monsenhor Manuel Larraín, bispo de Talca, e companheiro de Alberto na Universidade de Direito, “Padre Hurtado tinha certamente todas as características destes homens que Deus suscita, para ser em cada época, os enviados que testemunham a transcendência do Eterno e captam, para orientá-las, as angústias e inquietudes de sua geração”.
Esta sede de buscar mais leva o jovem a discernir sua vocação à vida religiosa. No dia 15 de agosto de 1923, dia em que se celebra a Assunção de Nossa Senhora, uma devoção muito marcante na vida de Hurtado, o jovem entra no noviciado da Companhia de Jesus. Seus companheiros de vida religiosa testemunham sua dedicação aos estudos e seu compromisso com a vida religiosa.
O Papa Bento XVI profere na canonização de Alberto Hurtado, em 23 de outubro de 2005: “A formação que recebeu na Companhia de Jesus, consolidada pela oração e pela adoração da Eucaristia, levou-o a deixar-se conquistar por Cristo, sendo um verdadeiro contemplativo na ação. No amor e na entrega total à vontade de Deus encontrou a força para o apostolado.”
Completa sua formação teológica e faz doutorado em Ciências Pedagógicas na Europa. Sua formação o levará a estar sempre em sintonia com a infância e juventude, uma marca registrada dos anos de missão de Hurtado.
É ordenado sacerdote em 1933 e escreve a um amigo sobre esta etapa: “Agora não desejo mais que exercer meu ministério com a maior plenitude possível de vida interior e de atividade exterior.” Talvez este seja o resumo de sua vida, plenitude na vida interior e no serviço. Muitos pensam que para estar em harmonia com Deus é necessário se desligar do mundo. Alberto é a prova de que é possível estar em profunda intimidade com Deus e estar em sintonia com o mundo, principalmente com os que mais sofrem.
Hurtado tinha um carisma único, e seu modo de vida, seu exemplo, convencia e trazia para si muitos jovens. Em 1936 ele volta à Santiago, e começa seu apostolado juvenil, através do Colégio Santo Inácio e da Universidade Católica. Graças ao seu trabalho incansável é nomeado assessor da Ação Católica de jovens, e meses depois é nomeado Assessor Nacional da Ação Católica Juvenil. Ele percorre o país animando os grupos e orientando retiros. Uma das grandes preocupações da igreja no Chile era a falta de vocações. Ele escreve um livro “É o Chile um país católico?”, onde fala sobre a crise vivida e a falta de interesse dos jovens pela vida religiosa. Através dos Exercícios Espirituais, encontra um caminho de diálogo com a juventude. Seus retiros eram conhecidos em todo o país. Seus textos foram multiplicados e transformados em livros.
Um jornal local, por ocasião de sua morte escreveu: “Entretanto acreditamos que Cristo volta, a cada certo tempo à Terra. Agora acaba de estar… e acaba de partir”. Para os chilenos, a presença de Alberto era tão forte que a sua figura era associada a um mensageiro direto de Deus, era aclamado como santo em vida. Sua grande marca, o apostolado social, tem início em 1944. Enquanto orientava um retiro para senhoras, fala da pobreza de sua cidade, do compromisso que os cristãos tem em ajudar aqueles que precisam de apoio. Ao final do retiro as senhoras começaram a lhe fazer doações, em terras, dinheiro e jóias, e neste momento nasce o “Hogar de Cristo”, com a missão de “criar um lar para os que não tem teto”.
Padre Hurtado dedica parte de seu tempo para acolher pessoas em situação de rua, sobretudo jovens e crianças. O seu meio de transporte, uma caminhonete verde, passa a ser símbolo de seu trabalho e vira a marca do Hogar de Cristo. É com ela que Alberto sai às ruas, para ajudar os que mais necessitam.
Incansável, ele funda em 1947 a Ação Sindical e Econômica Chilena, como meio de oferecer aos trabalhadores uma formação cristã, baseada na Doutrina Social da Igreja. Recebe duras críticas, mas não desanima, pois acreditava no seu ideal e lutava por uma sociedade mais justa. Em um de seus textos escreve: “Este regime de maior justiça social o desejamos ardentemente. É um imperativo de toda consciência e um clamor da verdadeira e autêntica fraternidade que nos ensinou Jesus. É indispensável abordar com seriedade e valentia alguns problemas econômico-sociais do país, para dar ao nosso povo tais condições para que sua vida chegue a ser verdadeiramente humana”.
Sua existência e missão foi um testemunho de vida, e não poderia ser diferente no final dos seus dias. Em 1951, foi diagnosticado com um câncer no pâncreas, e Alberto rendeu graças a Deus por sua doença, que o permitiu viver mais algum tempo, na companhia dos amigos. “Como não vou ficar contente! Como não estar agradecido a Deus! Em vez de uma morte violenta, manda-me uma longa enfermidade para que possa preparar-me; não me dá dores; dá-me o gosto de ver tantos amigos, de vê-los todos. Verdadeiramente, Deus tem sido para mim um pai carinhoso, o melhor dos pais.”
Como o próprio Padre Hurtado disse, sua vida foi um disparo para a eternidade. Falece aos 51 anos, no dia 18 de agosto de 1952, às cinco horas da tarde, cercado por seus irmãos de comunidade. Sua morte comoveu toda a sociedade chilena. Monsenhor Manuel Larraín, seu companheiro de toda a vida, exclama no funeral de Alberto: “E quando passe o tempo e a lei fatal do esquecimento vá deixando cair sobre os homens e sucessos sua poeira sutil, junto a este sepulcro viverá a lembrança de um sacerdote que amou muito a Deus e a seus irmãos, que amou os pobres e os humildes, e por eles, em suprema oblação, ofereceu sua vida. Tomai Senhor, e recebei!”
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